Banca de QUALIFICAÇÃO: CARLA APENBURG TRINDADE
09/01/2023 10:48
O modelo civilizatório moderno, legitimado sob uma lógica colonial, imperialista e capitalista, baseia e se estrutura a partir da expropriação, violação de direitos, exploração e violência sobre os sujeitos que possuem modos de vida antagônicos – comumente vistos como bucólicos e atrasados –. Entre esses sujeitos estão os povos e comunidades tradicionais, reconhecidos por estabelecerem em seus territórios, uma relação simbiótica entre os ciclos da natureza e seu modo de vida permeado por conhecimentos e práticas ancestrais (DIEGUES et al., 2000). Estes sujeitos adquirem também uma marca condicionante de gênero, pois a atividade de mariscagem – central neste estudo – é considerada um trabalho eminentemente feminino, haja vista que em Sergipe há o predomínio de pescadoras, representando 54,99% do segmento social (BRASIL, 2012). Essas mulheres vivem e trabalham no berçário da biodiversidade considerado por tantos, mera fonte de recursos: os manguezais. A partir dos megaprojetos de infraestrutura, agrohidronegócio e desenvolvimento capitalista estes ecossistemas se tornam caras engrenagens da acumulação de capital promovendo, por meio da apropriação de frações de natureza, a violência, exploração, expropriação e degradação socioambiental contra as mulheres, natureza e seus territórios. Assim, a presente pesquisa objetiva compreender como os conflitos por terra e água, decorrentes deste cenário, também reafirma a lógica patriarcal que violenta estrutural e cotidianamente os corpos e territórios das mulheres marisqueiras. Para isso, o estudo foi fundamentado nos pressupostos teórico-metodológicos do materialismo histórico-dialético e operacionalizado a partir de pesquisa bibliográfica e pesquisa exploratória utilizando-se também das contribuições das Epistemologias do Sul e Cartografias Feministas. À vista disso, os estudos até então realizados demonstram que o tripé do Patriarcado-Capitalismo-Racismo (SAFFIOTI, 1987) sustenta a contradição que preside cada uma dessas estruturas, que unidas, apresentam uma dinâmica própria, permeando também os conflitos que atingem os corpos e territórios das mulheres marisqueiras de maneira específica. Materializa-se então, através das situações de violência que decorrem dos conflitos territoriais, a condição patriarcal de controle que subordina as mulheres – enquanto reprodutoras, corpos objetificados e força de trabalho mais passível à exploração – e os territórios à lógica expansiva e destrutiva dos empreendimentos capitalistas de desenvolvimento. Uma vez imersas na lama e nas águas, as marisqueiras experienciam o contato direto com o mangue, que segue cada vez mais envenenado pela ganância dos atores do capital. A contaminação da terra e das águas juntamente à exploração de petróleo e minerais, o cercamento das águas e espaços de uso comum e histórico na atividade da mariscagem, a expansão da especulação imobiliária, instalação de corporações transnacionais do setor energético e avanço do agrohidronegócio nos territórios tradicionais (ROMERO et al. 2018) representam assim, não somente a imposição da lógica capitalista predatória contra a natureza, mas também masculinista e patriarcal sobre as mulheres marisqueiras e seus territórios.
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